COP16 termina sem acordo sobre financiamento do plano para salvar a natureza
A COP16 "terminou" neste sábado (2), após mais de dez horas de negociações truncadas sobre o financiamento de um plano para salvar a natureza, disse à AFP a presidente da cúpula, Susana Muhamad, na cidade de Cali, na Colômbia.
"Acabou (...) O governo colombiano empenhou grandes esforços, mobilizou toda sua capacidade, o povo da Colômbia investiu tudo, havia um ambiente muito bom, mas no final depende das partes e do processo de negociação", acrescentou Susana, que também é ministra do Meio Ambiente da Colômbia.
Depois de mais de dez horas de negociações que se estenderam pela madrugada, o quórum se rompeu pela ausência de delegados, que partiram para seus hotéis ou para pegar os voos de volta para seus países. Outros dormiram durante a plenária.
"Agora precisamos avançar e trabalhar com o que temos", acrescentou Susana.
Os quase 200 países participantes não alcançaram a meta de aumentar em até 200 bilhões de dólares anuais (1,16 trilhão de reais na cotação atual) os gastos para implementar as metas estabelecidas na COP15, entre elas de proteger 30% das terras e dos mares do mundo.
Segundo seu porta-voz David Ainsworth, a COP16 foi apenas "suspensa" e será retomada em data ainda a definir.
- "Incapazes" -
A missão da COP16, dois anos após o acordo de Kunming-Montreal, era potencializar os tímidos esforços do mundo para aplicar um plano para salvar o planeta e os seres vivos do desmatamento, superexploração, mudança climática e poluição, todos causados pela ação humana.
Mas depois de 12 dias de negociações, os países ricos, liderados em Cali por União Europeia, Japão e Canadá, não conseguiram entrar em acordo com as nações em desenvolvimento, liderados pelo Brasil e pelo bloco africano.
O primeiro grupo se recusou a criar um novo fundo para a natureza, enquanto o segundo o reivindicou de forma enérgica, alegando que os recursos existentes são inacessíveis e pouco equitativos.
"É um sinal negativo que vai repercutir nas demais negociações ambientais do fim do ano (clima, plásticos, desertificação) porque manifesta um profundo desacordo sobre a possibilidade política e técnica de fazer transferências Norte-Sul", avaliou Sébastien Treyer, do centro de pesquisas Iddri.
No entanto, a presidente da cúpula aplaudiu duas decisões tomadas durante a noite passada em claro: a aprovação de um fundo com lucros derivados de dados genéticos da natureza e a criação de um órgão para dar voz aos povos indígenas.
Com o lema 'Paz com a natureza', a Colômbia realizou a cúpula sobre biodiversidade mais concorrida da história, com 23 mil delegados inscritos e uma festiva 'zona verde' aberta ao público no centro da cidade, que contrastou com as discussões a portas fechadas. Também conseguiu afastar um grupo guerrilheiro que ameaçava a conferência.
- Duas vitórias -
Em seu principal avanço, os delegados comemoraram a criação de um fundo para a distribuição dos benefícios derivados dos dados de Sequenciamento Genético Digital (DSI).
Estes dados são utilizados principalmente em medicamentos e cosméticos, o que pode significar bilhões em lucros para seus criadores.
Mas pouco, e às vezes nenhum, desses lucros chegam às comunidades que descobriram a utilidade de uma espécie.
As empresas de certo porte que utilizarem o DSI devem contribuir com 0,1% de suas receitas ou 1% de seus lucros para um fundo que chamaram "Fundo de Cali".
Com os punhos erguidos e vestindo trajes tradicionais, os representantes dos povos indígenas comemoraram a criação de um órgão permanente que os reconheça como guardiões da natureza nas negociações da ONU sobre a biodiversidade.
"Este é um momento sem precedentes na história dos acordos ambientais multilaterais", declarou Camila Romero, representante indígena do Chile.
- Encontro marcado na Armênia -
Os países desenvolvidos comprometeram-se a aumentar sua ajuda anual à conservação da natureza de 15 milhões de dólares (87 milhões de reais) para US$ 30 milhões (174 milhões de reais) até 2030.
Na COP17, cuja sede a Armênia acaba de conquistar frente a seu inimigo histórico, o Azerbaijão, os países terão de fazer um balanço dos seus esforços, diante dos poucos avanços em Cali.
O secretário-geral da ONU, António Guterres, esteve dois dias em Cali com cinco chefes de Estado e dezenas de ministros para dar um novo impulso às negociações.
"O tempo é essencial. A sobrevivência da biodiversidade do nosso planeta - e a nossa própria sobrevivência - está em jogo", disse Guterres em uma tentativa de "acelerar" a tomada de decisões.
(F.Schuster--BBZ)